Cresci a ouvir histórias sobre o meu pai. Dizem que tinha um sorriso que iluminava a sala, mas as memórias que guardo dele são fragmentos marcados pela dor e pela ausência. O cancro dos pulmões levou-o quando eu tinha apenas sete anos. Antes dele, os meus avós também foram vítimas do mesmo destino, e essa sombra parece nunca ter abandonado a nossa família.
Durante anos, vivi com o medo a sussurrar ao meu ouvido. O que significa carregar este legado genético? Será que estou a caminhar para o mesmo desfecho? Às vezes, bastava uma tosse persistente para me fazer mergulhar num ciclo de ansiedade. Mas era o silêncio que me assustava mais — aquele momento em que a dúvida se transformava em realidade na minha cabeça, mesmo sem provas.
Lembro-me bem do dia em que decidi enfrentar o medo. Fiz as malas e marquei uma consulta com um geneticista. A espera pelos resultados foi das coisas mais angustiantes que já vivi. Queria saber, mas ao mesmo tempo não queria. É estranho como a verdade pode ser tão assustadora quanto o desconhecido.
Quando os resultados chegaram, fui confrontado com a notícia que sempre temi: carrego a mutação genética associada ao cancro hereditário da minha família. Foi um soco no estômago, mas também um despertar. Não tinha como controlar a genética, mas tinha como controlar o que fazia com essa informação.
Hoje, faço exames de rotina regularmente e tomo medidas preventivas para proteger a minha saúde. Mas, mais do que isso, aprendi a viver para além do medo. Não foi fácil. Houve noites de insónia, lágrimas e perguntas sem resposta. Contudo, percebi que a força não está em ignorar o medo, mas em olhá-lo de frente e recusar deixar que ele defina a minha vida.
Perdi o meu pai e os meus avós, e isso é uma dor que nunca desaparece. Mas quero acreditar que, ao cuidar de mim e ao partilhar esta experiência, estou a honrá-los de uma forma que faria sentido para eles. O medo ainda está cá — talvez sempre esteja. Mas hoje sei que não estou sozinho, e isso faz toda a diferença.